Aranhas

Escrito por Gwen. Publicado em Raças

As Aranhas
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Foi durante as Eras das Estrelas, enquanto escavava a sua negra fortaleza de Angband, que Melkor engendrou muitos monstros de diversas formas e espécies, que durante muito tempo perturbaram o mundo. Assim surgiram umas criaturas peçonhentas com forma de aranha, que teciam as suas teias de terror e engano, prendendo quem podiam nos seus abomináveis fios. Habitavam nos precepícios abruptos que desciam de Dorthonion, as terras florestadas das fronteiras setentrionais de Beleriand, e essa terra passou a chamar-se Ered Gorgoroth, as Montanhas do Terror, que se tornou um antro de medo e desespero.

Mas para falarmos sobre aranhas também temos que falar sobre... Ungoliant!!!
A sua origem permanece um mistério: mas, em textos antigos do HoME, ela é descrita como Móru, um espírito da “Noite Primeva” que tinha a habilidade de absorver a luz e gerar as trevas, tecendo pegajosas teias de escuridão, capturando nas suas redes estrelas, luas e todas as coisas brilhantes que navegavam os ares.

O que parece certo é que Ungoliant desceu da escuridão que envolve Arda, quando Melkor, cheio de ódio entrou com a sua hoste no reino de Manwë, antes da destruição das Lâmpadas dos Valar, e assumiu a forma de uma aranha monstruosa, que sorvia toda a luz que encontrava, tecendo depois teias de asfixiante negrume, que tinham o poder de estrangular a vontade das suas vítimas.

Melkor corrompeu-a para o seu serviço, mas o vazio de Ungoliant era tão grande que, na ânsia de ficar com tudo para si própria traíu o seu senhor e fugiu para a região de Avathar, no Sul de Aman, escapando à vigilância dos Valar, que tinham a sua atenção concentrada no Norte. De Avathar arrastou-se na direcção do Reino Abençoado, pois tinha fome de luz e ao mesmo tempo odiava-a.

Quando Melkor fugiu de Aman dirigiu-se em segredo para Sul, pois aí as sombras eram as mais densas e profundas do mundo, e procurou Ungoliant, convencendo-a a tornar-se sua aliada na vingança que planeava, prometendo dar-lhe tudo o que a sua gula exigisse.

Assim, Ungoliant teceu uma capa de negrume que os ocultava completamente, pois era feita de uma antiluz, um vácuo em que tudo parecia deixar de existir; dessa forma chegaram a Valmar sem ninguém dar por eles, pois era uma época de festival e encontravam-se todos em Taniquetil, nas Mansões de Manwë e Varda.

Então, Morgoth e Ungoliant dirigiram-se para as Duas Árvores e o Senhor Negro trespassou-as com a sua lança preta até ao cerne, ferindo-as profundamente, e Ungoliant colou o seu bico às feridas e sugou toda a seiva até ambas ficarem esgotadas, passando o seu veneno para os tecidos das Árvores e elas morreram. Nem mesmo nessa altura Ungoliant se sentiu saciada e dirigiu-se para os poços de Varda, feitos com os orvalhos prateados de Telperion e com a chuva dourada de Laurelin e bebeu até secá-los, inchando de uma maneira tão hedionda que até Melkor a temeu.

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Assim caíu sobre Valinor a Grande Escuridão, um negrume que parecia ter vida própria, pois era feito de malignidade, a partir da luz, e tinha a faculdade de entrar no coração e na mente e estrangular a própria vontade.

Os olhos de Manwë penetraram naquela escuridão até ver uma ainda mais densa que nem o seu olhar conseguia entrar, e que se afastava a grande velocidade. Assim soube que Melkor viera e partira, trazendo uma ajuda de além Arda, e de imediato se iniciou a perseguição.

Mas quando alcançavam aquela nuvem de trevas ficavam cegos, desalentados e presos numa rede preta que os desorientava; assim Melkor conseguiu a sua vingança e fugiu para a Terra Média com Ungoliant que, desconfiada, o observava atentamente.

Morgoth fez os possíveis por chegar às ruínas de Angband, a sua antiga fortaleza, onde esperava livrar-se de Ungoliant: mas ela apercebeu-se dos seus planos e exigiu que cumprisse a sua promessa, dando-lhe todo o tesouro de Formenos. O Senhor Escuro assim fez, relutante, pois o poder de Ungoliant crescera; mas depois ela reclamou os silmarils e Morgoth recusou-se a entregá-los, declarando-os seus para sempre.

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Então Ungoliant, que se tornara enorme, ergueu-se contra ele e envolveu-o numa rede de cordas que o estrangulavam. Morgoth soltou um grito terrível, que ecoou nas montanhas, e a partir desse momento os ecos da sua voz passaram a viver lá para sempre, e essa região passou a chamar-se Lammoth, que significa “Grande Eco”. E os balrogs que se tinham escondido em cavernas, muito abaixo dos salões em ruínas de Angband, à espera do seu senhor, ouviram-no e foram em seu auxílio como uma tempestade de fogo. Retalharam as teias de Ungoliant com os seus chicotes de fogo e ela fugiu, arrotando vapores negros para se ocultar e, na sua fuga do Norte, desceu a Beleriand e morou sob as Ered Gorgoroth, as Montanhas do Terror, onde viviam as outras criaturas com forma de aranha desde o tempo da escavação de Angband. E Ungoliant acasalou com elas e devorou-as, e mesmo depois dela própria ter partido para o Sul do mundo, a sua descendência continuou a morar lá e teceu as suas pavorosas teias e maléficos ninhos; e aquele vale escuro, nas fronteiras de Doriath, passou a chamar-se Nan Dungortheb, o vale da Morte Terrível; e todas as outras coisas vivas rejeitavam essa terra assombrada.

Do destino de Ungoliant ninguém sabe ao certo; há uma lenda que diz que se devorou a si mesma, na sua fome suprema; mas há outra ainda mais antiga que tem um fim diferente e conta que foi morta por Eärendil no Sul do mundo. Mas a terrível descendência de Ungoliant viveu e assombrou Nan Dungortheb, envenenando toda essa região onde poucos sobreviviam se, por engano, lá entravam. Aredhel, irmã de Turgon, e a sua escolta passaram por lá ao procurar a estrada que os levava ao reino de Celegorm e Curufin, e logo ficaram envoltos em sombras e foram perseguidos pelas terríveis crias de Ungoliant, dificilmente escapando com vida.

Também o valente povo dos Haladin passou pelas Montanhas do Terror quando, comandados por Haleth, se mudaram para a Floresta de Brethil. Haleth só conseguiu que o seu povo atravessasse esse mundo de horror e loucura, constrangendo-os a avançar pela força da sua vontade, mas sofreram muitas baixas.

Quando Beren foi obrigado a fugir de Dorthonion passou pelos percepícios de Ered Gorgoroth e o seu tormento foi grande, entrando em Doriath muito abatido. Esta viagem não foi dos feitos menores de Beren, mas ele nunca falou dela a ninguém, receoso que o seu horror lhe voltasse ao pensamento.

Depois da Guerra da Ira, em que Beleriand ficou submersa e Morgoth foi derrotado, quase todos os monstros foram destruídos; mas Shelob, a Grande, derradeira filha de Ungoliant, fugiu da destruição e instalou-se nas Ephel Dúath, a cordilheira que mais tarde ficaria entre Gondor e Mordor, muito antes desses reinos serem construídos. Bebia o sangue de Elfos e Homens, e tudo quanto fosse vivo a alimentava, inchando com os seus festins e tecendo teias de sombra. A sua descendência mais pequena, bastarda dos machos nascidos de si própria, que devorava, ia-se espalhando de vale em vale, dos Ephel Dúath aos montes orientais e à Floresta Tenebrosa. Mas não havia nenhuma que pudesse rivalizar com ela, a última filha de Ungoliant que atormentava o mundo, e não servia ninguém a não ser a si mesma. Dos Anos Negros poucas histórias há mas depressa se espalhou que vivia naquele local um terror pavoroso. Quando Sauron se mudou para Mordor, sabia onde ela se ocultava, e agradava-lhe que vivesse ali, pois constituía uma sentinela mais segura do que qualquer outra que o seu engenho pudesse ter criado. E nem se aborrecia se Shelob apanhava os seus Orcs: afinal de contas, tinha muitos. Muitas vezes Sauron enviava-lhe prisioneiros, que ela paralisava com o seu veneno e depois sugava-lhes o sangue e comia-os vivos, pois gostava do sangue morno e da carne com vida. Os próprios Orcs a temiam, e abriram muitos túneis para evitar o covil de Shelob, quando eram obrigados a passar entre Minas Morgul e Cirith Ungol.

No ano de 1050 da 3ª Era cai uma sombra sobre a Floresta Verde e os homens começam a chamar-lhe Floresta Tenebrosa. Em 1100 um poder maléfico construíu uma fortaleza em Dol Guldur e coisas maléficas começaram de novo a multiplicar-se na floresta, que se torna num antro de pavor. No ano de 2941, quando Bilbo e os Anões partiram na sua viagem para Erebor, passaram pela Floresta Tenebrosa onde escuras e densas teias de aranha se emaranhavam neles a todo o momento. As noites eram tão escuras que não viam nada, a não ser muitos olhos sinistros que os observavam. Todos os Anões acabaram por ser capturados pelas aranhas, e foi Bilbo que os salvou, pois acordou a tempo de ainda se conseguir libertar dos abomináveis fios que o prendiam, e com a sua espada atacou a horrível aranha que o tentava imobilizar com o seu veneno. Foi nessa altura que Bilbo deu o nome de Ferrão à espada que tinha encontrado na caverna dos Trolls.

Com a ajuda do Anel mágico que tinha encontrado na caverna dos Gnomos (que na verdade era o Um de Sauron) Bilbo aproximou-se invisível duma negra clareira do bosque cheia de aranhas enormes e repelentes, que combinavam entre si como comer os pobres Anões, que estavam fortemente embrulhados dentro de trouxas feitas com os seus fios viscosos, pendurados em árvores e entontecidos com o veneno. Bilbo foi extraordinariamente corajoso e, sózinho, atacou a colónia de aranhas, atirando-lhes pedras e cantando uns versos que muito as enfureceu, fazendo com que se lançassem todas na sua direcção, o que afastou os horríveis monstros dos Anões. Bilbo corria para diferentes pontos da clareira e, com a sua astúcia e a ajuda da sua espada conseguiu soltar os Anões, depois de muitas peripécias.

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Depois houve uma batalha terrível em que Bilbo, mais uma vez, lutou furiosamente com a sua espada élfica, pois os Anões estavam muito fracos e tontos por causa do veneno. Ao perceber que elas fechavam um círculo à volta deles, tecendo as suas teias de árvore em árvore, Bilbo voltou a atrair as aranhas para si cantando “aranha, aranhona” e “bola e bolona”, o que as fez inchar de fúria e partirem na direcção da voz, permitindo aos Anões fugirem da clareira enquanto o pequeno Hobbit apunhalava os seus corpos repelentes, afastando-se ao mesmo tempo daquele lugar. Por fim apoderou-se delas um medo mortal da Ferrão e desistiram de os perseguir voltando, decepcionadas, para a sua escura colónia, com grande alívio de Bilbo e dos Anões.

Quando, em 3019, Frodo e Sam tentam entrar em Mordor, com a missão desesperada de destruir o Um Anel, são guiados por Gollum que os conduz a uma armadilha, na esperança de conseguir o Anel para si. Ele sabia que no túnel que atravessava as Ephel Dúath vivia, há séculos e séculos, Shelob, a Grande, pois vira-a anos antes quando fugira de Mordor e adorara-a; e já lhe tinha prometido levar os dois hobbits como comida, esperando depois conseguir apanhar o Anel entre os ossos cuspidos. Assim, depois de subirem uma interminável escadaria, levou-os à entrada de uma caverna que ia dar ao outro lado das montanhas, de onde saia um odor pestilento, insuportável. Frodo e Sam caminham juntos, pois Gollum entretanto desaparecera; até que encontram, vinda de um dos muitos túneis escavados, Shelob, a aranha gigante, da qual emana uma grande maldade. Frodo, na sua aflição, lembra-se do frasco de Galadriel e levanta-o, enquanto empunha a sua pequena espada, Ferrão, na outra mão.

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Shelob, que nunca vira tal luz recua até à sua toca. Os hobbits correm até ao fim do túnel, que se encontra fechado pelas fortes teias da aranha; mas Frodo, com a sua espada élfica consegue cortá-los e correm para fora do covil. Shelob sai por outro lado e coloca-se entre Frodo e Sam, para apanhar o primeiro; Sam tenta ir em socorro de Frodo, mas Gollum agarra-o, pois tinha prometido os dois a Shelob.

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Quando Sam se consegue libertar, verifica que Shelob já tinha picado e enrolado Frodo na sua grossa teia, parecendo morto. Cheio de dor e desespero, Sam pega na Ferrão e desafia o enorme monstro, conseguindo cortar-lhe uma garra e furar-lhe um olho. Foi um combate feroz, e por fim Shelob tentou esmagar os dois hobbits, deixando cair o seu repelente corpo para cima de ambos. Mas Sam ergueu a Ferrão enquanto Shelob se deixava cair: e o próprio peso da aranha e a sua maldade foram responsáveis pelo profundo golpe que sofreu no ventre. Shelob nunca conhecera em toda a sua longa vida angústia maior, e com uma dor lacinante, retirou-se para cuidar dos seus ferimentos.

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O que aconteceu a Shelob nenhuma história fala: não se sabe se acabou por morrer ou se conseguiu sarar, tecendo de novo as suas teias de terror nos vales das Montanhas da Sombra. Depois da queda de Sauron, muitas criaturas das trevas fugiram ou foram esconder-se em lugares longe da esperança. A floresta Tenebrosa foi purificada e passou a chamar-se Floresta das Folhas Verdes. Mas a verdade é que, ainda hoje, somos por vezes incomodados por... aranhas!

Bibliografia:
- O Silmarillion
- Hobbit
- O Senhor dos Anéis
- Biografia de Ungolinat, por Mithrandir da Dúvendor

Mapa do Trajecto das Aranhas mais famosas, por Eru-o-Único
Legenda:

o traçado preto que vai de Valinor até Beleriand é Ungoliant (e Morgoth!)
a vermelho são os lugares onde houve algum acontecimento importante...

Depois o rectangulo no canto inferior direito:

a preto - caminhada de Shelob até Mordor
a verde - os descendentes de Shelob!

Artigo escrito por Gwen